
Reconhecimento internacional frustra campanha de Donald Trump, que esperava ser laureado após mediação no Oriente Médio
Por Daniel Gateno – Estadão Conteúdo
10 de outubro de 2025 – 7h29
A ativista e líder da oposição venezuelana María Corina Machado foi anunciada como a vencedora do Prêmio Nobel da Paz de 2025. A premiação reconhece sua atuação corajosa e incansável em prol da democracia na Venezuela, país mergulhado em uma profunda crise política sob o regime autoritário de Nicolás Maduro.
Segundo o Comitê Norueguês do Nobel, Machado foi escolhida “por seu trabalho incansável na promoção dos direitos democráticos para o povo da Venezuela e por sua luta para alcançar uma transição justa e pacífica da ditadura para a democracia”.
O presidente do comitê, Jørgen Watne Frydnes, destacou que Machado conseguiu unificar uma oposição que antes era profundamente fragmentada:
“Ela se tornou uma figura-chave e unificadora, reunindo diversas correntes políticas em torno da exigência por eleições livres e governo representativo.”
Luta pela democracia sob perseguição
Mesmo sob graves ameaças à sua vida, Machado permaneceu na Venezuela e atualmente vive na clandestinidade desde janeiro.
“Apesar das sérias ameaças, ela escolheu continuar no país. Essa decisão inspirou milhões. Quando autoritários tomam o poder, é essencial reconhecer quem tem coragem de resistir”, declarou Frydnes.
Em 2024, Machado foi impedida de concorrer às eleições presidenciais pelo regime de Maduro, que usou o aparato estatal para desqualificá-la. A opositora então apoiou a candidatura do diplomata Edmundo González Urrutia, que acabou também sendo perseguido e exilado na Espanha, onde recebeu asilo político.
As eleições foram marcadas por denúncias de fraude, repressão generalizada, prisões políticas e violações de direitos humanos. O Conselho Nacional Eleitoral, controlado por aliados de Maduro, anunciou a vitória do atual presidente, gerando protestos massivos em todo o país. A resposta violenta do governo resultou na morte de ao menos 20 manifestantes e no rompimento de relações diplomáticas com países como a Argentina.
Presença incerta na cerimônia em Oslo
A cerimônia de entrega do Nobel está marcada para dezembro, em Oslo, na Noruega. No entanto, não está confirmado se María Corina Machado poderá comparecer.
“É uma questão de segurança. Ainda é cedo para dizer. Sempre esperamos ter o laureado presente em Oslo, mas essa é uma situação séria que precisa ser resolvida primeiro”, afirmou Frydnes.
Frustração na Casa Branca: Trump reage à escolha
A decisão do Comitê Nobel frustrou as expectativas do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que esperava ser premiado este ano após intermediar um cessar-fogo entre Israel e o grupo extremista Hamas, anunciado no último dia 8.
Trump, que há anos expressa o desejo de receber o Nobel, disse que a não premiação seria um “desrespeito” aos Estados Unidos. Ele já havia sido indicado por aliados e líderes internacionais, mas sua campanha pública não influenciou a decisão.
“Recebemos indicações todos os anos, mas seguimos apenas os critérios estabelecidos por Alfred Nobel. Esse é nosso único norte”, declarou o presidente do comitê ao ser questionado sobre as manifestações de Trump.
Como funciona a escolha do Nobel da Paz
O Prêmio Nobel da Paz é concedido desde 1901 a indivíduos ou organizações que se destacam na promoção da paz, da diplomacia, dos direitos humanos ou do desarmamento. É o único Nobel entregue fora da Suécia – a cerimônia ocorre na Noruega.
O Comitê Norueguês do Nobel, composto por cinco membros indicados pelo Parlamento norueguês, avalia anualmente centenas de indicações feitas por acadêmicos, políticos, organizações e líderes mundiais. A lista final costuma ter entre 5 e 20 nomes. Quando não há consenso, a escolha se dá por votação.
Além de uma medalha de ouro, os vencedores recebem um prêmio em dinheiro. Em 2023, o valor da premiação foi de 11 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 4,8 milhões).
Premiados recentes reforçam defesa dos direitos humanos
Nos últimos anos, o Nobel da Paz tem sido concedido a figuras e organizações que atuam em contextos de repressão:
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2024 – Narges Mohammadi, ativista iraniana, pela luta pelos direitos das mulheres contra o regime opressor do Irã, mesmo sob prisão.
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2023 – Nihon Hidankyo, organização japonesa formada por sobreviventes das bombas atômicas, pela defesa do desarmamento nuclear.
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2021 – Maria Ressa (Filipinas) e Dmitri Muratov (Rússia), jornalistas premiados pela defesa da liberdade de imprensa.
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2020 – Programa Mundial de Alimentos (ONU), pelo combate à fome em zonas de guerra.
Machado agora integra esse seleto grupo de laureados que enfrentam regimes autoritários em defesa da liberdade, da democracia e da dignidade humana.